06 julio 2008

Ele:
Marcamos um novo encontro. É assim desde há três anos, telefono-te e tu estás sempre disponível para mim.
A minha vida está demasiado preenchida com o “que tem que ser”: o escritório, a gravata, a mulher, os filhos... Tu nunca colocas questões, também não estou à espera que o faças, aliás até agradeço esse teu aparente ar desinteressado com o que habitualmente me rodeia. Eu também nada pergunto, só pretendo aquela imagem, aquele espaço em que abres a porta do teu jardim para mim. Esse local imaginário no qual, por momentos, posso esquecer a vida lá fora e sentir-me livre e rei.
É após estes encontros que compreendo como tu preenches a minha rotineira existência.
Já tentei deixar-te. Vivemos numa sociedade carregada de preconceitos relativamente a este tipo de relações. Fizeram-me sentir egoísta, desonesto, pecador e até psicopata. Mas ninguém percebe, por muito que eu tente explicar que és tu a que me permite manter vivo, és a fonte onde vou beber a agua necessária para continuar neste emaranhado de responsabilidades do qual não posso sair.
Também pensei em ti, tinha receio de estar a empatar a tua vida; até descobrir que o nosso segredo afinal também preenchia a tua vida.
Mas ontem, pela primeira vez nestes três anos, chegaste diferente.
Ela:
Enquanto vou ter contigo mantenho a esperança de encontrar em ti alguém em quem refugiar-me, tenho tanto para contar, preciso que me ouças, que me compreendas.
E os nossos encontros são sempre assim. Eu chego cheia de solidão para ser partilhada. As vezes, até parece que queres saber de mim, …mas não, mais uma vez apenas queres satisfazer o teu desejo. Houve tempos em que as carícias, os beijos, …eram suficientes para dar-me alento e continuar.
Mas agora preciso falar, não procuro só sexo. Ontem, pela primeira vez, ao sentir a tua falta de disponibilidade para mim, despedi-me desajeitadamente.
O que ficaste a pensar, não sei, nem me interessa. Sai com o meu mesmo vazio, com a mesma solidão, com a sensação de, mais uma vez, ter procurado na pessoa errada.

5 comentarios:

Anónimo dijo...

"Muitas pessoas pensam que a felicidade somente será possível depois de alcançar algo, mas a verdade é que deixar para ser feliz amanhã é uma forma de ser infeliz.” Roberto Shinyashiki

Luís Galego dijo...

Eu chego cheia de solidão para ser partilhada.

Eu chego a este texto também com alguma solidão e embrulho-me nele...

Um beijo

Anónimo dijo...

A partilha é simples e a solidão também, basta optar. Abraços do EU, SER IMPERFEITO

Luis Nogueira Damas dijo...

" Chegaste. Eu não te esperava. Contigo trouxeste a ternura, o desejo e, mais tarde, o medo. Chegaste e eu não conhecia essa ternura, esse desejo. Em casa, no meu quarto, neste quarto, revi os teus olhos na memória, a ternura, o desejo. E, depois, aquilo que eu sabia, o medo. E passou tempo. Eu e tu sentimos esse tempo a passar mas, quando nos encontrámos de novo, soubemos que não nos tínhamos separado"

José Luis Peixoto; excerto de "Capricórnio a seus Pés", in Antídoto

Wolf dijo...

e eu na solidão me revejo...

não existe nada no vazio....por vezes não entendo o que tentam alcançar..

tenho uma justificação na minha caixinha das respostas para estas coisas...nas como sempre ...é a minha resposta ..para tentar ter algum equilibrio..


fica bem