12 agosto 2008




Tinhas o hábito de ser bela

Afastas-te novamente, num comportamento incompreensível, frio e distante, responsabilizando-me pela tua dor. O teu receio de eu ser quem não sou invade o teu pensamento, o teu olhar fica cego, os teus ouvidos surdos, a tua razão impermeável a qualquer argumento lógico, e odeias-me ainda quando eu sei que me amas.
O nosso lar transformou-se no campo de batalha das tuas incertezas. Há meses que tenho receio de chegar a casa, medo de falar, o meu passado te incomoda e o meu presente te confronta. Dizes que me amas, choras e me abraças, eu beijo o teu corpo e desejo beijar a tua alma, mas o meu amor não chega, nunca é suficiente para dar-te paz e segurança e fico submerso na tua exigência ilimitada.
Acredito que a tua paixão é honesta e compreendo-te, não é difícil compreender o ciúme, mas questiono-me se isto vai ter fim. Não consigo aceitar os teus comportamentos agressivos comigo, e ainda que sei que também sofres, que a tua insegurança te torna infeliz, não consigo, não aguento viver neste paraíso infernal onde o amor provoca ódio e afastamento. Ficaste encarcerada numa incerteza eterna.
Hoje vou-me embora exausto, desiludido, desgastado por este amor doentio. Amei-te tanto, se soubesses, mas hoje já só és aquela que me fascinou com o seu olhar e que tinha o hábito de ser bela.

6 comentarios:

Anónimo dijo...

soberbo...

naveguei em marés de questões, afundei-me na minha incapacidade de fundamentar o surrealismo de um amor..

entendo " a retirada exausta" como eu entendo...


cumprimentos

Anónimo dijo...

Uma resposta poderia ser algo como:

Li a tua carta. Se tivesse oportunidade a ti descrevia-te como tendo o inesperado no olhar e a razão de viver nas lágrimas. Percebo que o hábito comigo te tenha amassado essa espontaneidade: tu és um marinheiro que não suporta choro de mulher no cais. Eu era uma mulher que me queria inteira, lambuzando-me muitas vezes com o maltrato, com o rosto cego de te ter à minha medida, mas também casei-me contigo ao assumir o compromisso de ao mudar te deixar mudar. Penso que no esforço fomos felizes, pelo menos eu o fui. Mas progressivamente foste-te ligando mais à minha insegurança do que a mim, do que ela própria a mim se ligava. Sinto-me traída, como uma mulher rasgada pela surpresa. Daí ter partido primeiro, deixando-te com ela na cama. Ao partires espero que não a leves. Faz-me o favor de te ficares com o deixares de gostar de mim: é mais limpo, procura menos a perfeição. E eu que tinha o hábito de ser bela mas não perfeita, que criei o hábito de te amar mas na minha imperfeição.
Beijo meu marinheiro, que outras viagens te encontrem.

Anónimo dijo...

O SORRISO (poema chinês)

Um sorriso não custa nada
Mas produz muito.
Ele enriquece aqueles que o recebem
Sem empobrecer aqueles que o dão.
Ele permanece apenas um momento
Mas a sua lembrança é eterna.
Ninguém é rico o suficiente
Para poder passar sem ele
E ninguém é deserdado o suficiente Para o ter por esmola
E portanto, ele não se pode comprar nem roubar
Pois ele apenas tem valor a partir do momento em que é dado.
E se lhe recusarem um sorriso que merece
Sejam generosos, dê-lhes o seu
Pois ninguém necessita mais de um sorriso
Que aquele que não o consegue dar.


Beijos para ti que és tão sorridente...

Anónimo dijo...

todo o amor do mundo não foi suficiente porque o amor não serve de nada. ficaram só
os papéis e a tristeza, ficou só a amargura e a cinza dos cigarros e da morte.
os domingos e a noites que passamos a fazer planos não foram suficientes e foram
demasiados porque hoje são como sangue no teu rosto, são como lágrimas.
sei que nos amámos muito e um dia, quando já não te encontrar em cada instante, em cada hora,
não irei negar isso. não irei negar nunca que te amei. nem mesmo quando estver deitado,
nu, sobre os lençóis de outra e ela me obrigar a dizer que a amo antes de foder.

Anónimo dijo...

Encontrei uma preta que estava a chorar,
Pedi-lhe uma lágrima para a analisar.
Recolhi a lágrima com todo o cuidado num tubo de ensaio bem esterilizado.
Olhei-a de um lado, de outro e de frente: tinha um ar de gota muito transparente. Mandei vir os ácidos, as bases e os sais, as drogas usadas em casos que tais.
Ensaiei a frio, experimentei ao lume, de todas as vezes deu-me o que é costume: nem sinais de negro nem vestígios de ódio.
Água (quase tudo) e cloreto de sódio.

António Gedeão


Um grande grande Beijo!

Luís Galego dijo...

há algum tempo que por aqui não passava e logo deparo com este texto que me comove....parabens pela tristeza em forma de beleza...